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Redes sociais

A legalidade de infiltrar um agente entre manifestantes

Capitão do Exército é suspeito de usar redes sociais para se aproximar de um grupo de manifestantes que viria a ser preso no dia de um protesto contra o governo Temer. Especialistas em segurança pública debatem o episódio.

13/09/2016 –

Em 4 de setembro, primeiro domingo após o impeachment de Dilma Rousseff e a oficialização do vice Michel Temer no comando do país, manifestantes organizaram um ato em São Paulo contra o novo mandatário e pela antecipação das eleições presidenciais.

Horas antes do protesto, que ocorreria à tarde na Avenida Paulista, um grupo de 21 jovens foi cercado e preso nas imediações do Centro Cultural São Paulo, na zona sul.

A ação envolveu policiais militares e acabou com parte dos suspeitos levada para o Deic, departamento estadual da Polícia Civil responsável pela investigação do crime organizado. Todos foram soltos no dia seguinte por determinação judicial.

“O Brasil, como Estado Democrático de Direito, não pode legitimar a atuação de praticar verdadeira ‘prisão para averiguação’ sob o pretexto de que estudantes poderiam, eventualmente, praticar atos de violência e vandalismo em manifestação ideológica. Este tempo, felizmente, já passou”

Em entrevista ao site “Ponte”, o grupo de jovens afirmou que havia um agente infiltrado entre eles. A suspeita recaiu sobre um rapaz que se apresentava como “Balta”, ou Baltazar. Segundo reportagem do jornal “El Pais”, “Balta” é, na verdade, o capitão Willian Pina Botelho, que se aproximou dos manifestantes por meio das redes sociais.

De acordo com o jornal “O Globo”, o Exército apura as circunstâncias da atuação do oficial. Em nota, a Polícia Militar paulista afirmou que “desconhece qualquer ação de inteligência que tenha sido realizada por outro órgão de segurança” no episódio.

Em entrevista à imprensa ocorrida no dia da detenção, o coronel da PM Dimitrios Fyskatoris afirmou que a abordagem do grupo ocorreu por acaso por policiais que passavam pelo local e teriam identificado “atitude suspeita”. Pelo menos nove carros da PM, além de um ônibus para transporte de suspeitos, foram mobilizados na operação.

Abaixo, uma discussão a respeito do episódio, a partir da opinião de três especialistas em segurança pública.

A legalidade da atuação de um agente do Exército

Coronel da reserva da PM e ex-secretário nacional de Segurança Pública, José Vicente da Silva Filho afirma que as Forças Armadas têm a prerrogativa de atuar em missões pela manutenção da ordem pública, e para isso precisa se informar junto à sociedade para detectar problemas. “Em qualquer lugar do mundo o Exército precisa coletar essas informações para fazer uma avaliação do que está ocorrendo”, diz.

Ele ressalta, porém, que um agente em missão do Exército não pode agir de forma ativa. Conforme relatos de integrantes do grupo que acabou preso, Botelho teria sugerido aos jovens que se deslocassem da estação Consolação do Metrô para o Centro Cultural São Paulo, onde houve a abordagem da PM.

“Esse tipo de intervenção escapa do escopo de um agente infiltrado, que deve se manter em um plano afastado, como apenas mais um membro do grupo. Não manipular, mas observar e coletar informações”, afirma José Vicente da Silva.

O advogado especialista em Direito Militar Daniel Accioly afirma que a ação foi irregular desde o princípio, e esse tipo de investigação deve ser feito exclusivamente por forças policiais. “Em situações de normalidade, temos o dispositivo da Lei e da Ordem [portaria normativa 3.461/MD de 2013], que ocorre quando alguns chefes da República [como governadores] solicitam excepcionalmente a presença das Forças Armadas para garantir a legalidade [e assumir ações de policiamento], mas isso é praticamente declarar a falência do Estado em Segurança Pública. É difícil um governador fazer isso. Isso pode acontecer quando a Polícia Militar paralisa suas atividades em um Estado, por exemplo.”

Para o advogado, a infiltração de forças federais se justificaria se houvesse risco de atentados contra instituições políticas federais, como o Palácio do Planalto, ou contra alvos militares. “Não há justificativa para esse tipo de intervenção em um ato pelo ‘Fora Temer’”, diz Accioly.

Recém empossado, Temer havia publicado dias antes um Decreto Presidencial autorizando o emprego das Forças Armadas nas seis unidades da Federação pelas quais a tocha da Paraolimpíada passaria. Um dos locais era exatamente a Avenida Paulista, naquele mesmo domingo. Mas o governo do Estado não utilizou dessa prerrogativa, afirmando que que não havia “a menor necessidade de as Forças Armadas atuarem na segurança” do evento que ocorreu horas antes do protesto.

Para Accioly, é problemático que haja um capitão do Exército infiltrado em um grupo pouco organizado, e sem evidências de que esse grupo estivesse planejando comportamento violento. “Isso me causa estranheza, é uma forma de criminalização dos movimentos sociais”, afirma. Ele avalia que explicações precisam ser cobradas do comando do Exército e do Ministério da Justiça.

Guaracy Mingardi, ex-investigador da Polícia Civil, ex-secretário nacional de Segurança Pública e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, também afirma que houve excesso. “O Exército não tem nada o que fazer aí. Se houvesse uma organização federal envolvida, essa teria que ser a Abin [Agência Brasileira de Inteligência], que é uma organização civil”, diz.

Em que casos a polícia pode usar infiltrados

Para José Vicente da Silva, tanto Polícia Militar quanto Polícia Civil preveem em suas regras internas, que são compostas por determinações com diversos níveis de sigilo e não estão disponíveis para o resto da sociedade, métodos de coleta de informação.

A PM tem a função de realizar ações ostensivas, ou seja, se mostrar presente e coibir a prática de crimes. Por isso, esse tipo de informação é importante, segundo ele, para determinar o efetivo que deve ser enviado para uma manifestação e que tipo de atitude deve ser esperada dos manifestantes. “A Polícia Militar não pode se basear nas informações de jornais”, afirma.

A Polícia Civil tem a função de investigar crimes. Um infiltrado pode ser usado para juntar provas sobre a ocorrência de uma ação criminosa, ou fazer um flagrante, por exemplo. “A Polícia Civil já trabalha sem uniforme. Imagina alguém investigar um ponto de venda de drogas fardado. Em um grupo de manifestantes, ela tem a função de identificar quais indivíduos podem estar por trás das ações de depredação e agressões policiais, coletar evidências e prendê-los”, diz.

Ele ressalta que a infiltração de agentes também está prevista na lei 12.850 de 2013, conhecida como Lei do Crime Organizado, segundo a qual o Ministério Público ou delegados de polícia podem pedir a juízes a autorização para infiltrar quadros em organizações criminosas quando essa medida for necessária.

José Vicente da Silva afirma, no entanto, que a ação contra os manifestantes no dia 4 de setembro como um todo foi desastrada porque “há indícios de que pessoas foram incriminadas para que pudessem ser encaminhadas ao Judiciário. O enquadramento das pessoas foi inadequado”.

Mingardi concorda. “É um caso prender quando eu percebo um comportamento criminoso. Mas prender sem crime, usando uma barra de ferro e vinagre como evidências pode ser uma criminalização dos movimentos sociais”, diz.

Fonte: Nexo Jornal, por André Cabette Fábio – (Saga Policial)

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