01/04/2020
Pandemia e porte ilegal de arma – por Frederico Cattani e Caio Rangel
“Ainda não se vive um apocalipse zumbi.”
Uma situação interessante que entrou em debate, ainda em meio acadêmico, foi sobre a possibilidade, ou não, da excludente de ilicitude no porte ilegal de arma de fogo, sob o argumento de legítima defesa (ou inexigibilidade de conduta diversa), motivado na sensação de insegurança ou de risco imediato, frente notícias de que presosestão sendo soltos em razão do Covid-19 (coronavírus) e que a ruas estão vazias, dando oportunidade aos oportunistas.
O primeiro destaque é que ainda não se vive um apocalipse zumbi, isto é, a segurança pública continua ativa e operante (com as mesmas falhas e falta de estrutura, mas ativa), assim como diversos setores essenciais a vida em sociedade. No entanto, o argumento seria de liberdade para presos, redução de circulação de pessoas, ambientes ermos e distanciamento social, o que geraria insegurança e demora de resposta por populares e pela polícia.
O crime de porte ilegal de arma de fogo, inclusive de acessório ou munição, é reconhecido como uma infração de mera conduta, mas caberia entrar no debate sobre o perigo abstrato ou concreto, em razão do próprio argumento de cidades desabitadas, mas o foco é na excludente de ilicitude (ou inexigibilidade de conduta diversa). A premissa é a simples realização de qualquer dos núcleos previstos no tipo penal para sua consumação, ou seja, portar a arma de fogo de forma desautorizada.
A mera alegação de insegurança não possui o alcance de afastar a ilicitude do fato, seja pela legítima defesa (seja pela inexigibilidade de conduta diversa). Seriam necessários índices e notícias de que na localidade específica em que a pessoa transita com a arma, existe desamparo policial na mesma proporção em que a pandemia trouxe números de aumento de violência.
A alegação de situação de insegurança hipotética (ou potencial risco abstrato), não pode autorizar as pessoas se armarem, agindo contrariamente à lei. Frisa-se, não está em debate a forma que se compram armas de fogo ou o direito de andar armado, pois a premissa é a lei atual e o crime de porte ilegal de arma de fogo vigente.
Neste sentido, e com base na jurisprudência atual, se pode concluir que não havendo comprovação de injusta agressão, atual ou iminente (não cabendo hipóteses abstratas); ou não sendo situação anormal em razão da qual se pudesse tolerar que pessoas (e não somente uma pessoa) atue praticando o ilícito penal de portar arma (pandemia vs apocalipse zumbi?); ou, ainda, que nenhum outro comportamento seja exigível naquela determinada situação… não há que se falar na excludente de ilicitude ou inexigibilidade de conduta diversa para o porte ilegal de arma de fogo motivado na sensação de insegurança.
Fonte: por Frederico Cattani, Mestre em Ciências Criminais, Especialista em Direito Empresarial, Professor de Graduação e Pós-Graduação, Advogado – do canal Ciências Criminais.
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