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Políticos desejam que Delegado vire Juiz por vingança

Em entrevista para a revista Época, promotor afirma que políticos querem aprovar PEC 89, que transforma Delegado em Juiz de Instrução, para retaliar Judiciário. Seria uma vingança pela atuação do Judiciário em investigações envolvendo políticos, como na Operação Lava Jato. “A PEC 89 é visceralmente inconstitucional”

27/08/2015

promotor paulista Roberto Livianu está empenhado em uma missão. Não se trata de uma investigação. No comando do Movimento do Ministério Público Democrático (MPD), entidade nacional que reúne promotores, dedica-se, desde julho, a convencer deputados a engavetar a PEC 89. A Proposta de Emenda à Constituição cria a figura do juiz de instrução penal – que comandaria as investigações. A nova função, se aprovada, poderá ser exercida por delegados. “Isto agride o principio básico da Constituição da separação entre os poderes. Coloca um delegado estadual, subordinado ao governador em última instância, e um delegado federal, subordinado à presidência da República, para exercer funções próprias do Judiciário”, diz Livianu. Para ele, trata-se de uma tentativa de políticos fragilizados pela Operação Lava Jato de retaliar o Judiciário. “Estão querendo cortar as asas do Ministério Público e da magistratura.”

Em entrevista a ÉPOCA, além da PEC 89, Livianu fala sobre a repercussão da Operação Lava Jato – para ele, uma investigação “histórica” –, as promoções no Ministério Público e a escolha dos procuradores-gerais.

ÉPOCA – Há uma Proposta de Emenda à Constituição na Câmara que propõe a criação da função do juiz de instrução: a PEC 89. Delegados seriam designados para estas vagas. Qual é a sua opinião sobre a PEC?
Livianu – É visceralmente inconstitucional. Agride o principio básico da Constituição da separação, independência e autocontrole entre os poderes. Ela coloca um delegado estadual, subordinado ao governador em última instância, e um delegado federal, subordinado à presidência da República, para exercer funções próprias do Judiciário.

ÉPOCA – Na Itália, o juiz de instrução não trouxe rapidez na punição dos crimes?
Livianu – É importante frisar que lá o juiz de instrução tem de ser um magistrado. Juízes e promotores também ingressam juntos na carreira. Um promotor pode se tornar juiz e vice-versa. Não há esta interferência do Executivo no Judiciário como esta PEC quer. Realmente, é um modelo que dá certo em muitos países da Europa. Oferece um trâmite mais eficiente na instrução criminal, com uma única fase presidida pelo juiz de instrução. É diferente do que existe hoje aqui no Brasil, em que, a polícia, em parceria com o Ministério Público, investiga. Depois, oferece-se a denúncia. Recebida, aí, começa a fase judicial.

ÉPOCA – Caso a PEC prospere, o delegado não passaria a integrar o Judiciário ao ser tornar juiz de instrução? Portanto, ele não se tornaria independente do poder Executivo?
Livianu – Transferir uma pessoa de poder numa canetada é uma aberração. Deve-se passar em concurso e mostrar qualificação para ingressar na magistratura. Esta PEC permite aquilo que é o sonho do Executivo em qualquer lugar do mundo: controlar também as investigações.

ÉPOCA – A Lava Jato, entre outras operações, não mostra uma autonomia, na prática, das polícias estaduais e da Polícia Federal?
Livianu – Olha, eu louvo a importância da polícia e acho que tem de ocorrer parceria, mas cada um no seu quadrado. Até porque o Ministério Público não precisa de uma investigação policial para denunciar alguém. Um exemplo é o famoso caso do esquadrão da morte na ditadura. Lá quem matava era a própria polícia. Se o Helio Bicudo (promotor paulista) não tivesse investigado e denunciado, mesmo sem investigação policial, não ocorreria a punição dos culpados.

ÉPOCA – Por falar em autonomia do MP e do MPF, ela é comprometida pelo atual modelo de nomeação dos procuradores-gerais de Justiça dos Estados e o da República?
Livianu –
 Acho que o modelo de nomeação precisa mudar. Hoje, os governadores e o presidente podem escolher em uma canetada no fundo do gabinete o procurador-geral de Justiça dos Estados ou da República. O mais complicado é que são justamente eles que têm a atribuição fiscalizá-los. Três anos atrás, por exemplo, o governador Geraldo Alckmin nomeou, em São Paulo, o derrotado na lista tríplice. Não é plausível que o Executivo tenha tanto poder. Defendo uma reforma política do Ministério Público. Um dos principais itens, inclusive, é a forma de escolha dos procuradores-gerais de Justiça.

ÉPOCA – Qual é o modelo de escolha que o senhor defende?
Livianu –
 A categoria faria uma eleição com voto uninominal facultativo. O mais votado seria sabatinado pelo poder Legislativo. Submeter o mais votado a uma sabatina pública no parlamento é democrático e transparente. Defendo um único mandato de três anos sem recondução consecutiva. Além disto, defendo que todos os Estados permitam também que promotores e não apenas procuradores de Justiça possam concorrem ao cargo de procurador-geral de Justiça. O mesmo sistema poder ser utilizado em nível federal para a escolha do Procurador-Geral da República.

ÉPOCA – A promoção ao cargo de procurador de Justiça segue critérios como a antiguidade e o merecimento. Liberar qualquer promotor a concorrer ao posto de procurador-geral de Justiça não possibilitaria a chegada ao cargo máximo do Ministério Público de, por exemplo, alguém recém-ingresso ou sem experiência?
Livianu –
 Tem de se exigir uma maturidade institucional. Teria de possuir um tempo de carreira mínimo, que poderia ser de dez anos, e uma idade mínima de 35 anos. Mas não tem sentido que um promotor experiente e com uma carreira brilhante, muitas vezes, se aposente sem nunca ter podido concorrer ao cargo de procurador-geral de Justiça. A liberação da candidatura de promotores traz benefícios para a instituição. Amplia o leque e democratiza.

ÉPOCA – Existe uma relação direta entre o aumento das investigações contra parlamentares e projetos que alteraram o Judiciário?
Livianu – Claro, é uma reação até compreensível. Hoje, existem mais de dois mil projetos tramitando em Brasília para retirar poderes do Ministério Público. O que isto significa? É um sinal que o Ministério Público anda trabalhando muito.

ÉPOCA – Há então uma associação direta entre a PEC 89 e a Lava Jato?
Livianu – A PEC surgiu no olho do furacão da Lava Jato no meio de julho. Estão querendo cortar as asas do Ministério Público e da magistratura. Estão querendo desmontar a eficiência destas instituições, reconhecidas pela população.

ÉPOCA – O Ministério Público alcançou sua evidência máxima com a Operação Lava Jato. Como o senhor analisa esta investigação?
Roberto Livianu – 
É histórica. Nunca gente detentora de tanto poder foi pega pelo trabalho do Ministério Público e da Polícia Federal. O juiz Sergio Moro é um personagem em evidência e louvo o trabalho que faz. Mas quem levou os casos ao juiz Moro? Foram os procuradores da República. Por que as prisões desses políticos e empreiteiros não são revogadas? Porque a colheita das provas está sendo benfeita. É um dos trabalhos do MP reconhecidos pela sociedade. Se pegar a pesquisa da Fundação Getúlio Vargas sobre a credibilidade das instituições, o Ministério Público está lá em cima há anos.

ÉPOCA – Mas isto não ocorre, como dizem advogados, devido a uma certa espetacularização nas ações do Ministério Público e do Ministério Público Federal?
Livianu –
 Em algumas investigações, acontece. Na Lava Jato, não vi. Os procuradores estão tendo uma postura comedida. Agora, é natural que eles sejam admirados por pedir a prisão e acusar pessoas antes intocáveis. Temos de ter também outra coisa clara: na Constituição há o princípio da publicidade. O sigilo nas apurações é exceção. Foi-se o tempo em que os promotores, os juízes e os delegados viviam um tanto quanto encastelados. Até porque, se não falarem, a população vai achar que há algo estranho ou não explicado. Prestar contas é um dever.

ÉPOCA – Esta publicidade dos casos não pode levar a uma mácula na imagem de investigados se depois inocentados?
Livianu –
 Acho que, por isto, tem de ter cuidado para não desrespeitar a regra do sigilo e da intimidade.

ÉPOCA – A Constituição garante que as pessoas possam recorrer de condenações. Então, não há uma arbitrariedade em tornar públicos detalhes de um caso quando ainda existe a possibilidade de absolvição?
Livianu –
 Óbvio que a presunção existe, mas precisamos achar um jeito de administrar esta questão sob pena de virarmos a república da impunidade. Tem um momento que a decisão judicial precisa produzir consequências. Se o primeiro grau condenou, o segundo grau condenou, não é plausível que fiquem impunes.

Fonte: Época, com título Saga Policial

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